PROFECIAS OU “PROFETADAS”?
Por Thiago Fidelis
INTRODUÇÃO
O
dom de profecia, enumerado por Paulo na lista de I Coríntios 12.8-10, nunca foi
tão banalizado como nos tempos modernos. Envaidecidos pela falsa
espiritualidade, crentes imaturos têm feito uso irresponsável deste dom
extraordinário do Espírito. Neste cenário, onde impera o antropocentrismo e a
pobreza bíblica, sobra criatividade na tentativa de oferecer à plateia um
evangelho raso e nada sacrificial. Os ditos profetas, tomados pela carnalidade,
agitam as multidões com mensagens falsamente inspiradas, distanciando o culto
de sua proposta maior: exaltar a Deus, em Cristo Jesus, no poder do Espírito.
Em
resposta a este fenômeno, apreciaremos a importância do dom de profecia para
hoje, iniciando com sua definição bíblica, criticando a falsa manifestação
profética neopentecostal, destacando sua finalidade e finalizando com as regras
para o uso equilibrado do dom.
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“A outro, poder para operar milagres; a outro,
profecia...”
(I Coríntios 12.10, NVI)
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I
– O QUE É O DOM DE PROFECIA?
Segundo
o Dicionário Vine, o termo profecia (do grego: προφητεία = propheteia) significa “a declaração da mente e do conselho de Deus”
(formado de pro, “adiante, antecipado”, e phemi. “falar”. [1]
Em
outras palavras, uma profecia é uma mensagem de inspiração divina que revela
antecipadamente a vontade de Deus para pessoas ou situações específicas. De
maneira soberana, Deus, através da profecia, se comunica com o homem, para
edificar, exortar e consolar (I Co 14.3).
O
dom de profecia se expressa no Novo Testamento de maneira distinta do Antigo e,
ainda no Novo, não deve ser confundido com o dom ministerial de profeta (Ef
4.11).
No
Antigo Testamento, a profecia se manifestava através do ofício profético,
quando pouquíssimos homens foram levantados para apregoar a reconciliação entre
a humanidade caída e o Senhor (cf. Jr 1.5; Is 6.8; Ez 3.17). O profeta do
Antigo Testamento era um homem que, além de transmitir a mensagem de Deus,
tinha outras atribuições de ordem nacional. Na unção dos reis, eram os profetas
que tinham a incumbência de derramar o azeite santo da unção sobre a cabeça dos
governantes (1 Sm 16.1; 1 Rs 19.16). [2]
Já
no Novo Testamento, encerra-se o ofício profético e encontram-se
o dom espiritual de profecia e o dom ministerial de profeta. Para
esclarecer este ponto, é preciso diferenciar os textos de I Coríntios 12.10 e
Efésios 4.11. Escrevendo aos coríntios, Paulo exorta a que se buscasse “com
zelo os dons espirituais, mas principalmente o de profetizar” (I Co 14.1), uma
demonstração clara da abundância e da disponibilidade do dom para todos os que
o buscam. Entretanto, o mesmo não se aplica ao texto de Efésios, uma vez que o
“dom de profeta”, (4.11) é dado apenas a “uns”, visando “o aperfeiçoamento dos
santos, para a obra do ministério” (v. 12).
Por
seu caráter sobrenatural, a profecia deve ser uma manifestação espontânea da
parte de Deus através de Seus profetas. Ao contrário do que se vê em muitas
igrejas, ditas pentecostais, a Bíblia não apoia a entrega manipulada de
profecias. Deus fala como, quando e por quem quer!
Uma
vez definida a profecia, nos sentidos vetero e neotestamentário, prossigamos em
nossa reflexão com uma crítica ao que não é profecia.
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“Amados,
não deis crédito a qualquer espírito; antes, provai os espíritos se procedem de
Deus, porque muitos falsos profetas têm saído pelo mundo afora.”
(I
João 4.1)
II
– ATO PROFÉTICO E CONFISSÃO POSITIVA: PROFÉTICOS?
Como
previu Paulo, os últimos dias são tempos trabalhosos em que a sã doutrina é afrontada
por homens que dão ouvidos a doutrinas de demônios (I Tm 4.1), que manipulam as
Escrituras a bel-prazer, preferindo a palha seca das heresias em lugar da
infalível e penetrante Palavra de Deus.
Nas
últimas décadas, com o avanço do Neopentecostalismo, ventos de doutrina tem
feito confusão entre o falso e o verdadeiro Pentecostalismo. Do pacote herético
neopentecostal destaco duas heresias gravíssimas: o ato profético e a confissão
positiva.
Segundo
o movimento Reavivamento Europa, atos proféticos:
“São
ações realizadas por homens, profetas de Deus com determinado sentido
profético, com intuito de profetizar com ações e símbolos. São sinais que
apontam para o reino espiritual e que tem consequências no reino físico. São
ações expressas em atitudes e palavras.” [3]
Supostamente
guiados pelo Espírito, homens organizam reuniões, congressos e campanhas,
mobilizando milhares de pessoas, a fim de “trazer à existência” novas
realidades espirituais, através de “sete voltas ao redor de Jericó”,
declarações de posse territorial do Senhor Jesus (leia-se: “O Brasil é do
Senhor Jesus”) e “transmissões de geração”, apenas para citar alguns exemplos.
Envoltos em rituais carregados de símbolos e linguagem triunfalista, os
difusores deste movimento, ainda que o neguem veementemente, não encontram
amparo bíblico para suas práticas e, ao invés de clamar pela intervenção do
Pai, como povo seu (II Cr 7.14), arrogantemente se colocam na posição de
“semi-deuses”, no afã de resolver prática e miraculosamente problemas
financeiros, sociais e morais de nações inteiras ou setores específicos da
sociedade.
Semelhantemente,
difundem a perniciosa doutrina da confissão positiva que, resumidamente, é a
autoridade dada por Deus aos seus filhos para “profetizar” vitórias sobre suas
vidas. Como em atos proféticos, a confissão positiva supostamente provoca o
mover de Deus. Representado por conferencistas de renome, tais como os
norte-americanos Morris Cerullo e Kenneth Hagin (in memoriam) e os brasileiros
Renê Terra Nova e Valnice Milhomens, o movimento “Palavra da Fé” sistematiza
esta doutrina pela distinção dos termos logos
e rhema. Para eles, logos é a Palavra de Deus propriamente
dita, enquanto o rhema é a mensagem
“profética”, proferida pelos crentes, autorizada por Deus e cumprida por Ele
mesmo, quando estes têm liberdade para “declarar” ou “decretar” suas bênçãos.
O
Pentecostalismo Clássico, ramificação ortodoxa do Cristianismo, deve rejeitar
abertamente estas práticas, pois, como crentes na atualidade do dom de
profecia, os pentecostais encontram apoio para o uso equilibrado e
cristocêntrico da profecia. As heresias do ato profético e da confissão
positiva, assevero, em nada tem que ver com as Escrituras e sequer representam
o Pentecostalismo defendido pela Assembleia de Deus e demais igrejas
pentecostais históricas (incluo aqui o Pentecostalismo de “segunda onda”, a
saber, as igrejas “renovadas”).
“Mas
quem profetiza o faz para a edificação, encorajamento e consolação dos homens.
(I
Coríntios 14:3, NVI)
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III
– FINALIDADE DO DOM DE PROFECIA
Discorrendo
sobre o uso da profecia no culto público, Paulo destacou três finalidades deste
dom: edificar, exortar e consolar. Didaticamente, vamos definir tais
finalidades.
No
original grego, “edificar” (oikodomeõ – οίκοδομέω) significa literalmente
“construir uma casa” [...] É usado metaforicamente no sentido de “edificar”,
promovendo o crescimento espiritual e o desenvolvimento do caráter dos crentes
através do ensino ou do exemplo, sugerindo tal progresso espiritual como
resultado de trabalho paciente. (VINE, p. 583)
A
edificação que a profecia promove é a transmissão de ensino, a fim de fazer
crescer os que a recebem. O Espírito Santo, utilizando esta operação, anuncia à
Igreja verdades espirituais que, obviamente, só poderiam ser ditas sob seu
impulso. Notamos, contudo, uma má interpretação cessacionista acerca deste
ponto. Para os anti-pentecostais, a profecia fere o Sola Scriptura (“Somente as Escrituras”), pois colocaria as
manifestações espirituais em pé de igualdade com as Escrituras. Negamos que
isso seja verdade. Embora o Espírito que inspirou as Escrituras seja o mesmo
que usa os crentes em profecia, a mensagem profética não equivale à Palavra de
Deus, pois, enquanto a profecia é temporal, a Palavra é eterna. Enquanto uma
diz respeito exclusivamente a pessoas específicas, a Bíblia guia,
infalivelmente, a Igreja do Senhor, em todos os tempos e circunstâncias. Saiba
mais no próximo tópico.
Exortar,
do grego “parakaleõ” (παρακαλέω), “chamar uma pessoa” (formado de para: “para o
lado", e kaleõ: "chamar”), denota: (a) “chamar, pedir, invocar";
(b) “admoestar, exortar, instigar” a pessoa a buscar algum curso de conduta (sempre
prospectivo, olhando para o futuro [...]) (VINE, p. 635).
A
exortação profética cumpre o papel de alertar ou orientar a Igreja acerca de
situações futuras, isto é promessas condicionais ou convocação à reconciliação.
Desta forma, uma exortação é o conjunto de palavras de despertamento e
reflexão, vindos do Senhor, a fim de que Sua Noiva se posicione em relação aos
mistérios revelados através do profeta. Quantas vezes não vimos Deus utilizar
servos cheios do Espírito para alertar e consertar a Igreja?
Por
fim, consolar, do grego “paramutheomai” (παραμυθέομαι), denota “falar
ternamente com”. Enquanto a exortação diz respeito às coisas futuras, a
consolação é a atuação profética nas lembranças e provações vividas. É através
da consolação que o Divino Consolador, pelos profetas, verte o bálsamo da paz
sobre nossos inquietos corações. Quando cansados pelos percalços do estreito
caminho da fé, Deus acha por bem nos tocar com suas Doces Consolações,
dando-nos a certeza de que Ele, como Pai Amoroso, tem sempre o melhor para nós.
Aleluia!
Pela
edificação, Deus nos faz crescer; pela exortação, nos aproxima dEle; pela
consolação, nos acalenta.
“Que
fareis, pois irmãos? Quando vos ajuntais, cada um de vós tem salmo, tem
doutrina, tem revelação, tem língua, tem interpretação. Faça-se tudo para
edificação.”
(I
Coríntios 14.26, ARC)
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IV
– DO USO EQUILIBRADO DA PROFECIA
A
Bíblia, nosso infalível manual de fé, regula perfeitamente o dom de profecia.
Analisemos, pois, algumas orientações:
a) Toda
profecia deve ser testada (I Co 14.29; I Ts 5.20,21)
É
preciso ter muita prudência ao ouvir e aprovar uma profecia, mormente por causa
dos desvios doutrinários modernos. No meio evangélico circula o jargão “Não
toqueis no ungido”. Distorcendo completamente o sentido de textos como I
Crônicas 16.21-22 e I Samuel 24.6, falsos pentecostais “matam e morrem” por
manipuladores de mente que lhes entrega mensagens agradáveis aos ouvidos e lhes
ilude com promessas que o Senhor jamais fez. “Não desprezeis as profecias”,
disse Paulo. E, assim como nos orienta o apóstolo, não é correto negligenciar
as profecias, mas ouvir tudo com bastante discernimento e, finalmente, dar
crédito ao que vier da parte de Deus.
b) A
Igreja deve estar atenta ao cumprimento das profecias
A
profecia inspirada por Deus reflete o caráter verdadeiro de quem a mandou
entregar: o Senhor, pois, Deus não é homem, para que minta; nem filho do homem
para que se arrependa. O que fala se cumpre e o que fala, confirma. (Nm 23.19)
Não
se deve testar uma profecia observando o status do profeta, muito menos sua
habilidade em emocionar a igreja, senão conferindo o cumprimento de suas
palavras. Deus é fiel ao que diz e vela para cumprir Sua Palavra! (Jr 1.12)
c) Toda
profecia deve glorificar a Deus e Sua Palavra
A
Lei Mosaica condenava à morte todo profeta que levasse o povo a servir a outros
deuses (Dt 13.1-3,5). Semelhantemente, no Novo Testamento, falsas profecias
trazem morte e condenação sobre aqueles que nelas confiam (II Pe 2.1).
A
palavra profética, como já destacamos, nos aproxima do Senhor e nos leva a
cumprir sua vontade. As profecias são espontâneas e Deus só se manifesta
através delas quando Ele julga necessário.
Lembro-me
de uma profecia que recebi alguns anos atrás pela qual o Senhor, entre outras
coisas me dizia: “Coma a Palavra.”
Como
pode ter sido esta mensagem falsamente inspirada, se apenas me provocou mais
desejo de buscar ao Senhor e provocou tantos avanços em minha espiritualidade?
Se não fora o Senhor quem falou, quem o disse?
Somente
a frieza da tradição poderia tentar restringir o mover do Espírito ao primeiro
século e nega-Lhe o direito de continuar operando no meio do Seu povo.
CONCLUSÃO
Ainda
hoje, Deus tem prazer em derramar dons espirituais sobre a Igreja. Porém, a
Noiva do Cordeiro não pode vacilar no uso destas dádivas, uma vez que as recebeu
para seu próprio crescimento. Jamais deveríamos rejeitar a atualidade do dom da
profecia, pois negaríamos a nós mesmos uma poderosa ferramenta de impacto,
iluminação e refrigério. Assim, rechacemos os engodos do Cessacionismo e do
Neopentecostalismo. Que preguemos a Palavra, que utilizemos os dons!
Sobre
o autor: Thiago Fidelis é bacharelando em Relações Internacionais (Faculdade Damas)
e membro da Igreja Evangélica Assembleia de Deus em Recife – PE, onde coopera
com a mocidade nos departamentos de evangelismo, ensino e música.
Bibliografia
[1]
VINE, W.E; UNGER, Merrill F.; WHITE JR., William. Dicionário Vine. Rio de Janeiro, CPAD, 2002. p. 902
[2]
RENOVATO, Elinaldo. Dons espirituais
& ministeriais: servindo a Deus e aos homens com poder extraordinário. Rio
de Janeiro, CPAD, 2014. p. 83
[3]
Disponível em: https://reavivamentoeuropa.wordpress.com/o-que-e-um-ato-profetico/
Acessado
em: 06/09/16
Parabéns pelo artigo, muito sóbrio e esclarecedor.
ResponderExcluirGlória a Deus! Fico feliz que tenha sido edificado. A paz do Senhor!
ExcluirGlória a Deus! Fico feliz que tenha sido edificado. A paz do Senhor!
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