quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Serie oque o texto realmente diz?

Explicando esse texto que é muito mal compreendido por deterministas.


Esse texto é de uma irma do grupo arminianismo que é a irma Glória Hefzibá


Diz a Epístola de Paulo aos Filipenses, em seu capítulo 2, versículo 13:

"Porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a Sua boa vontade."

Já que muitos usam esse versículo para defender o monergismo, vou colar aqui para vocês algo que escrevi em 2010 para um amigo. Reli e ainda penso do mesmo jeito. Vejam o que acham.

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Vamos ao que diz o capítulo 2 da epístola paulina. O capítulo começa assim (vv. 1 e 2):

"Portanto, se há algum conforto em Cristo, se alguma consolação de amor, se alguma comunhão no Espírito, se alguns entranháveis afetos e compaixões, completai o meu gozo, para que sintais o mesmo, tendo o mesmo amor, o mesmo ânimo, sentindo uma mesma coisa."

Antes de mais nada, veja que ele começa com um "Portanto". Então, precisamos descobrir o que se dizia antes, a razão dessa conclusão "portanto". Vamos voltar ao capítulo 1. Lá, Paulo inicia a carta com uma saudação, dizendo que os crentes de Filipos estão sempre em suas orações. Ele realmente tinha motivos para se alegrar pelo povo daquele lugar. Eles foram fiéis a Paulo tanto em momentos felizes, quanto nos tristes (vv. 5 e 7).

Ele amava aquelas pessoas (v. 8 ) e por isso pedia a Deus que "o vosso amor cresça mais e mais em ciência e em todo o conhecimento, para que aproveis as coisas excelentes, para que sejais sinceros, e sem escândalo algum até ao dia de Cristo; cheios dos frutos de justiça, que são por Jesus Cristo, para glória e louvor de Deus" (vv. 9-11).

Paulo fala tudo isso porque ele foi preso (vv. 12, 13) e ele queria mostrar que, mesmo naquela situação, ele estava contente por eles, satisfeito pelo que eles fizeram, e para provar que Deus tornou a maldição em bênção (v. 14), porque muitos, vendo a prisão de Paulo, animaram-se a pregar o Evangelho.

Depois, Paulo confessa que alguns dentre esses novos pregadores só proclamavam a Cristo por inveja, achando que iriam, com isso, aumentar a aflição de Paulo (vv. 15, 16). Então, o Apóstolo fala que isso não aumenta sua angústia, afinal, o que importa é que Cristo seja pregado (v. 18 ).

Paulo está em aperto. Não está morto, para poder gozar a presença de Cristo na Glória, nem pode pregar, mesmo estando vivo. É um dilema. Mas ele espera que Deus vá livrá-lo da prisão e dessa forma ele poderá visitar os filipenses mais uma vez.

Nesse ponto, o Apóstolo dá um conselho: que tanto ele indo como não indo, os filipenses deveriam se portar "dignamente conforme o evangelho de Cristo, para que (...) ouça acerca de vós que estais num mesmo espírito, combatendo juntamente com o mesmo ânimo pela fé do evangelho" (v. 27).

Indo ou não, Paulo queria ouvir a notícia de que eles estavam, ainda assim, vivendo em comunhão e crescendo na fé!

Agora, podemos ir ao capítulo 2.

"Portanto, se há algum conforto em Cristo, se alguma consolação de amor, se alguma comunhão no Espírito, se alguns entranháveis afetos e compaixões, completai o meu gozo, para que sintais o mesmo, tendo o mesmo amor, o mesmo ânimo, sentindo uma mesma coisa."

Paulo diz aos filipenses que, como eles devem ter o mesmo amor, o mesmo ânimo, sentir uma mesma coisa, então que façam isso! Dessa maneira, Paulo teria o gozo completado, pois sem dúvidas há conforto, consolação de amor e comunhão no Espírito, em Cristo!

Seguindo pelo capítulo 2, Paulo dá mais dicas de como eles poderiam viver assim: nada fazendo por vanglória, considerando os outros como superiores, etc (vv. 2-4). E mais, ele diz que os filipenses deveriam fazer isso porque o próprio Jesus fez isso (vv. 5-11) - e Ele é nosso exemplo!

Chegamos então no versículo que é a questão dessa minha explicação. Mas ele é só uma parte de uma frase maior, que começa no versículo 12, então vou transcrever por completo aqui:

"De sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora na minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e tremor; porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a Sua boa vontade."

Nesse trecho, o português da versão que estou usando não ajudou muito, não é verdade? Estou usando a versão Almeida Corrigida. Mas vou colocar aqui os mesmos versículos em outras versões, assim vamos entender melhor o que foi dito nessa frase tão longa (muito a cara de Paulo!).

ARA: "Assim, pois, amados meus, como sempre obedecestes, não só na minha presença, porém, muito mais agora, na minha ausência, desenvolvei a vossa salvação com temor e tremor; porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a Sua boa vontade."

NTLH: "Portanto, meus queridos amigos, vocês que me obedeceram sempre quando eu estava aí, devem me obedecer muito mais agora que estou ausente. Continuem trabalhando com respeito e temor a Deus para completar a salvação de vocês. Pois Deus está sempre agindo em vocês para que obedeçam à vontade Dele, tanto no pensamento como nas ações."

NVI: "Assim, meus amados, como sempre vocês obedeceram, não apenas em minha presença, porém muito mais agora na minha ausência, ponham em ação a salvação de vocês com temor e tremor, pois é Deus quem efetua em vocês tanto o querer quanto o realizar, de acordo com a boa vontade Dele."

KJV: "Wherefore, my beloved, as ye have always obeyed, not as in my presence only, but now much more in my absence, work out your own salvation with fear and trembling. For it is God which worketh in you both to will and to do of {His} good pleasure."

RVR: "Por tanto, amados míos, como siempre habéis obedecido, no como en mi presencia solamente, sino mucho más ahora en mi ausencia, ocupaos en vuestra salvación con temor y temblor; porque Dios es el que en vosotros obra así el querer como el hacer, por Su buena voluntad."

ASV: "So then, my beloved, even as ye have always obeyed, not as in my presence only, but now much more in my absence, work out your own salvation with fear and trembling; for it is God who worketh in you both to will and to work, for His good pleasure."

Acho que agora podemos entender, não é? A primeira versão que usei embaralha um pouco a ordem da frase. Poderíamos entender aqueles versículos assim:

"Operem a salvação de vocês com temor e tremor da mesma forma como vocês faziam quando eu estava presente e ainda mais agora estando ausente, sendo obedientes; porque Deus é o que opera em vocês tanto o querer como o efetuar, segundo a Sua boa vontade."

Então, o que se diz aí é que os filipenses não precisam de Paulo para crescerem na salvação. Eles conseguem ser obedientes tanto na presença quanto na ausência dele e deveriam continuar fazendo isso, porque é Deus quem opera tanto o querer como o efetuar, ou seja, porque eles só dependem de Deus, não de Paulo!

Paulo prossegue o capítulo com mais conselhos, que você pode ler na epístola. Diz também sobre alguns fatos, como enviar Epafrodito para auxiliar os filipenses, etc.

A epístola é muito curta, portanto você não tem motivo algum para não a ler completa =]

> Afinal, o que quis dizer Fp 2:13?

Minha intenção é mostrar qual o verdadeiro assunto desse versículo: nossa dependência é só para com Deus, é d'Ele que precisamos! Não se fala aí sobre como Deus salva as pessoas, segundo dizem alguns monergistas, mas apenas que Ele salva. Não há explicação de como ocorre o processo da salvação aí.

Não se fala, muito menos, da salvação instantânea (conversão), aquele exato momento em nossa vida em que aceitamos a Cristo e nos tornamos filhos de Deus. Fala sobre a vida cristã, sobre desenvolver a salvação. A ARA foi feliz em usar o verbo "desenvolver", da mesma forma que foi feliz a NTLH dizendo "continuem trabalhando".

Logo, não usem o versículo 14 do segundo capítulo de Filipenses para defender posições em soteriologia.

> Mas e se falasse sobre como Deus nos salva?

Vamos supor que monergistas estivessem certos, usando a premissa deles: Fp 2:13 fala que é Deus quem nos dá o desejo de buscarmos a Jesus e é Ele quem opera a salvação em nós.

Se fosse esse o caso do versículo, de falar como Deus salva as pessoas, então teríamos uma grande contradição no texto. Isso porque, no versículo exatamente anterior, Paulo diz que os filipenses deveriam operar a sua salvação com temor e tremor. Eram eles quem deveriam operar essa salvação! Como podemos provar que o trabalho de salvar alguém é só de Deus através de um texto que diz para nós trabalharmos nela?!

> Conclusão

A salvação de que Paulo fala em Fp 2:13, na qual devemos trabalhar, é nosso dia-a-dia com Deus, nosso trabalho por Ele, nossa consagração. Crescer como cristãos. Nada fala sobre a salvação, aquela que nos salva de nossos pecados, obtida unicamente pela fé no sacrifício de Jesus.

sábado, 12 de outubro de 2013

Lista de Textos sobre a Expiação Ilimitada ou Universal.

                                                            EXPIAÇÃO UNIVERSAL



Jesus morreu pela humanidade! Aleluia!


Ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo. (1 João 2:2)

Todos nós temos andado desgarrados como ovelhas; temo-nos desviado cada um para o seu caminho; e Jeová fez cair sobre ele a iniquidade de todos nós. (Isaías 53:6)

Vinde a mim todos os que andais em trabalho e vos achais carregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para as vossas almas. Pois o meu jugo é suave, e o meu fardo leve. (Mateus 11:28-30)

Assim não é da vontade de vosso Pai que está nos céus, que pereça um destes pequeninos. (Mateus 18:14)

…este veio como testemunha para dar testemunho da luz, a fim de que todos cressem por meio dele. (João 1:07)

No dia seguinte viu João a Jesus que vinha para ele, e disse: Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo! (João 1:29)

Pois assim amou Deus ao mundo, que deu seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê, não pereça, mas tenha a vida eterna. Pois Deus não enviou o Filho ao mundo para julgar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por ele. (João 3:16-17)

Eu sou o pão vivo que desci do céu; se alguém comer deste pão, viverá eternamente; e o pão que eu darei pela vida do mundo, é a minha carne. (João 6:33 , 51)

Se alguém ouvir as minhas palavras, e não as guardar, eu não o julgo; porque não vim a julgar o mundo, mas a salvar o mundo. (João 12:47)

porque todos pecaram e necessitam da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente pela sua graça mediante a redenção que há em Cristo Jesus; (Romanos 3:23-24)

Quando nós ainda éramos fracos, Cristo morreu a seu tempo pelos ímpios. (Romanos 5:06)

Mas não é assim o dom como a ofensa; porque se pela ofensa de um só morreram todos, muito mais a graça de Deus e o dom pela graça de um só homem, Jesus Cristo, abundou para com todos. (Romanos 5:15)

porque: Todo aquele que invocar o nome do Senhor, será salvo. (Romanos 10:13)

Isto é bom e agradável diante de Deus nosso Salvador, que deseja que todos os homens sejam salvos, e que cheguem ao pleno conhecimento da verdade. Pois só há um Deus e só há um mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus homem, que se deu a si mesmo em resgate por todos—testemunho que se deve dar em seus tempos; (1 Timóteo 2:3-6)

pois para isso é que trabalhamos e lutamos, porque temos posto a nossa esperança no Deus vivo, que é o Salvador de todos os homens, especialmente dos que creem. (1 Timóteo 4:10)

Pois a graça de Deus se manifestou, trazendo a salvação a todos os homens, (Tito 2:11)

porém àquele Jesus, que foi feito um pouco menor que os anjos, nós o vemos, por causa do sofrimento da morte, coroado de glória e de honra, para que, pela graça de Deus, provasse a morte a favor de todo o homem. (Hebreus 2:9)

Não retarda o Senhor a sua promessa, como alguns entendem; mas ele é longânimo para convosco, não querendo que alguns pereçam, mas que todos venham ao arrependimento. (2 Pedro 3:9)

Nós temos visto e testificamos que o Pai enviou a seu Filho como Salvador do mundo. (1 João 4:14)

André Tomé Remostrante

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Eleiçao corporativa em romanos


Pessoal essa matéria foi tirada do site http://www.arminianismo.com


Eleição Corporativa em Romanos 9:

Uma Resposta a Thomas Schreiner



Brian J. Abasciano*



I. INTRODUÇÃO



Passaram-se pouco mais de doze anos desde que Thomas Schreiner defendeu neste jornal que Romanos 9 ensina a eleição individual para salvação.[1] Ele corretamente mostra que Romanos 9 é um texto-prova padrão aos calvinistas, que defendem que Deus incondicionalmente elege pessoas para serem salvas. Ele também corretamente observa que cada vez mais os estudiosos estão rejeitando a exegese calvinista do capítulo como uma leitura equivocada do texto.[2] Seu artigo busca refutar duas objeções comuns à interpretação calvinista, a saber, que Romanos 9 (1) trata do destino histórico, nacional, antes que da salvação, e/ou (2) diz respeito à salvação de grupos antes que de indivíduos. Não discordo da ideia principal do primeiro ponto de Schreiner. O argumento de Paulo em Romanos 9 certamente diz respeito à salvação de Israel.[3] Mas não acho convincente sua tentativa de opor-se à primazia da eleição corporativa em Romanos 9. Este artigo irá examinar seus argumentos e buscará expressar a natureza da eleição como ela é apresentada em Romanos 9.



II. ESCLARECENDO O DEBATE E MINANDO O ARGUMENTO: DETERMINANDO A ORIENTAÇÃO PRIMÁRIA DA ELEIÇÃO



Schreiner argumenta que a eleição descrita em Romanos 9 “é taPnto corporativa como individual e que uma referência à primeira não descarta a possibilidade da última”.[4] Na verdade, ele mantém que a eleição corporativa e a individual são inseparáveis, e que a primeira requer a última.[5] Em um sentido, isto deve ser verdadeiro, mas não da maneira individualista que Schreiner pretende. Ele parece argumentar contra uma concepção da eleição corporativa que nega qualquer espaço para o indivíduo. Isto parece dever-se à posição dos estudiosos com quem ele interage e/ou alguma má compreensão de sua parte do que implica a eleição corporativa.[6] Mas em qualquer caso, quero deixar claro que quando falo de Romanos 9 como contendo a eleição corporativa antes que a individual, estou falando da orientação primária da eleição, que necessariamente deve incluir, de certa forma, indivíduos em sua extensão.[7] Mas isto de modo algum significa um conceito tradicional da eleição individual e na verdade destroi muito da argumentação de Schreiner. Uma visão adequada da eleição corporativa, que considera plenamente o lugar dos indivíduos, evita muito da crítica de Schreiner.



Schreiner parece defender uma eleição cuja orientação é igualmente corporativa e individual. Mas esta é uma posição insustentável, ironicamente devido à ligação inextricável entre o indivíduo e o grupo ao qual Schreiner repetidamente chama a atenção. Pois há uma ligação lógica definida entre o grupo e o indivíduo, mas esta ligação deve ser vista primariamente a partir da perspectiva corporativa ou individual. Interessantemente, ela pode ser vista legitimamente a partir das duas perspectivas, mas não ambas igualmente ao mesmo tempo. Ou a eleição corporativa ou a individual deve ser primária (veja abaixo). A questão importante que Schreiner deixa de dar atenção é: Como os aspectos corporativos e individuais da eleição se relacionam? Qual é primário?



Se a eleição corporativa é primária, então o grupo é o foco da eleição, e os indivíduos são eleitos somente em ligação com o grupo. Se a eleição individual é primária, então os indivíduos são separadamente o foco da eleição, e o grupo é eleito somente como uma reunião de indivíduos eleitos. Assim, ou o foco corporativo da eleição determina a identidade e benefícios do indivíduo baseado na participação no grupo, ou o foco individual da eleição determina a identidade e benefícios do grupo baseado nos indivíduos que foram reunidos conforme suas características/statusindividuais similares. O fato que Schreiner repetidamente afirma que a eleição corporativa requer a eleição individual calvinista, equivalendo a uma eleição de indivíduos como entidades autônomas diante de Deus, somente mostra que ele está assumindo a eleição individual como sendo primária. Pois se a eleição é primariamente individual, então a eleição corporativa deve igualmente envolver a eleição individual, visto que a identidade do grupo é inteiramente determinada pela identidade dos indivíduos que o compõem. O fato que Schreiner pressupõe esta posição sugere sua falha em não conseguir enxergar além de um ponto de vista moderno, ocidental, individualista.



III. A PRIMAZIA DA ELEIÇÃO CORPORATIVA



            Schreiner nota que muitos estudiosos foram persuadidos pela visão corporativa da eleição.[8] Isto acontece por uma boa razão. O argumento a favor da primazia da eleição corporativa no pensamento de Paulo em geral e Romanos 9 em particular é forte. Além da evidência fornecida pela exegese de Romanos 9-11 e outros textos específicos do Novo Testamento,[9] há três fatores gerais que a apoiam.



1. O conceito da eleição do Antigo Testamento é claramente corporativo.[10] Deus escolheu o povo de Israel em Abraão, Isaque e Jacó/Israel (Dt 4.37; 7.6-8). Isto é, escolhendo Jacó/Israel, o representante corporativo/da aliança, Deus também escolheu seus descendentes como seu povo da aliança. É uma questão de teologia da aliança do Antigo Testamento. O representante da aliança de um lado e o povo/nação de Israel do outro são o foco da eleição divina da aliança, e os indivíduos são eleitos somente como membros do povo eleito. Além disso, em princípio, indivíduos estrangeiros que não eram originalmente membros do povo eleito poderiam juntar-se ao povo escolhido e tornar-se parte dos eleitos,[11] demonstrando novamente que o foco da eleição era a comunidade da aliança e que os indivíduos encontravam sua eleição através de sua associação com o povo eleito. A natureza corporativa da eleição do povo de Deus no Antigo Testamento é tão bem reconhecida que Moo, um defensor da eleição individual no pensamento de Paulo e Romanos 9, admite que Paulo teria encontrado somente a eleição corporativa nas Escrituras e em sua tradição judaica.[12] E John Piper, um dos mais vigorosos e diretos defensores modernos da eleição individual, é forçado a reconhecer que “a salvação eterna do indivíduo como Paulo a ensina é quase nunca assunto de discussão no Antigo Testamento”.[13]



De fato, as passagens do Antigo Testamento que Paulo interpreta e emprega em Romanos 9 têm uma visão corporativa da eleição. Isto pesa consideravelmente a favor da hipótese de que Paulo fala de eleição corporativa em Romanos 9 também. Ele seguramente esperava que seu público estivesse familiarizado com as passagens às quais ele refere e fossem compreendidas como apontando para os contextos originais amplos de suas citações e alusões escriturísticas.[14] Até mesmo passagens que poderiam parecer a olhos individualistas modernos como fazendo referência à eleição individual se revelam como corporativas em orientação à luz do cenário do Antigo Testamento.



Por exemplo, as referências de Paulo às escolhas divinas de Isaque sobre Ismael (Rm 9.7-9) e Jacó sobre Esaú (Rm 9.10-13) invocam exemplos de eleição primariamente corporativa. O ponto da eleição de Isaque na passagem que Paulo cita é que a semente de Abraão, o povo eleito da aliança, seria chamado/identificado em ligação com Isaque (Rm 9.7; Gn 21.12). Os indivíduos seriam considerados como parte do povo da aliança baseados em sua relação com Isaque. Paulo interpreta isto como significando que somente “os filhos da promessa são contados como descendência”,[15] isto é, como o povo escolhido de Deus (9.8). Similarmente, ambas as citações de Paulo a respeito de Jacó falam de sua eleição primariamente como a eleição de um povo. O contexto mais completo da primeira citação de Jacó por Paulo torna isto perfeitamente claro: “E o Senhor lhe disse: Duas nações há no teu ventre, e dois povos se dividirão das tuas entranhas, e um povo será mais forte do que o outro povo, e o maior servirá ao menor” (Gn 25.23; cf. Rm 9.12). Igualmente, como Cranfield comenta sobre a segunda citação de Jacó (Rm 9.13), “Não resta dúvida de que a preocupação de Ml 1.2-5 está com as nações de Israel e de Edom, e é natural supor que por ‘Jacó’ e ‘Esaú’ Paulo também entende não apenas os filhos gêmeos de Isaque mas também as pessoas que descenderam deles”.[16]



Os exemplos de Isaque e Jacó expressam o conceito veterotestamentário da solidariedade ou representação corporativa no qual o indivíduo representa a comunidade e é identificado com ela e vice-versa.[17] O conceito é especialmente evidente no caso de reis e patriarcas, que são vistos representar seu povo e totalizá-los em si mesmos, especialmente no contexto de aliança. A observação é importante porque ela fornece o modelo para o papel representativo corporativo de Cristo no Novo Testamento como a semente de Abraão (Gl 3.16), o verdadeiro Israel e corporificação do povo da aliança de Deus. Como Gl 3-4, uma passagem na qual Paulo usa linguagem similar e trata assuntos similares,[18] confirma, os cristãos somente são considerados a semente de Abraão porque eles estão em Cristo pela fé, e portanto compartilham de sua identidade como seu representante (da aliança). Surpreendentemente, Paulo também usa a mesma linguagem “em x” de Gn 21.12/Rm 9.7 para descrever a participação na aliança através do representante da aliança quando ele fala explicitamente da eleição salvadora em Ef 1.4, declarando que a Igreja foi escolhida em Cristo.[19]



Mas começamos a ir além do ponto em apreço. O que precisa ser salientado neste momento é que uma eleição corporativa que, por um lado, permitia um completo e vigoroso papel para o indivíduo no contexto da comunidade e, por outro, subordinava o indivíduo ao coletivo ao conceder status de eleito aos indivíduos baseados em sua associação com a comunidade da aliança era a visão do Antigo Testamento e dos textos bíblicos que Paulo usa em Romanos 9. O ônus da prova se encontra com aqueles que afirmam que Paulo se afastou desta concepção bíblica e judaica da eleição.



2. A linguagem explícita da eleição para salvação é sempre corporativa em Paulo (e o restante do Novo Testamento). Enquanto se poderia argumentar que o conceito de eleição pode estar presente e ser aplicado diretamente aos indivíduos mesmo quando a linguagem explícita não está, isto ainda favorece um entendimento corporativo da eleição, que alguém procuraria em vão por um uso evidente da linguagem da eleição para salvação com referência a um indivíduo. Paulo fala, por exemplo, dos “escolhidos de Deus” (εκλεκτώνθεού, Rm 8.33), a Igreja como sendo escolhida em Cristo (έξελέξατοήμαςεναύτω, Ef 1.4) e de τηνέκλογήνυμών (“sua [plural] eleição”, 1Ts 1.4), mas nunca com linguagem individual.[20] Eu questionaria que o conceito de eleição direta de indivíduos como indivíduos está presente em algum lugar em Paulo ou no Novo Testamento, mas esta é uma questão de exegese de alguns textos específicos que está muito além do escopo da presente discussão. Aqui, eu somente quero mostrar que a linguagem corporativa que cerca a eleição para salvação em Paulo e no Novo Testamento certamente pesa em favor de uma concepção corporativa da eleição. Se alguém objetasse que devemos esperar somente linguagem corporativa porque Paulo e os outros escritores do Novo Testamento estavam dirigindo-se a igrejas e frequentemente discutindo questões de importância a todos os cristãos, eu concordaria, e acrescentaria que isto somente realçaria a orientação corporativa dos textos com os quais estamos lidando.



3. A cultura mediterrânea helenística do primeiro século era de perspectiva coletivista antes que individualista, e o Judaísmo do primeiro século era ainda mais.[21] Isto significa, inter alia [N.T.: entre outras coisas], que a perspectiva dominante de Paulo e seus contemporâneos era que o grupo era primário e o indivíduo secundário.[22] O indivíduo, embora importante, não era pensado de forma independente, mas como incorporado no grupo do qual ele era um membro. A identidade pessoal era derivada do grupo ao invés do grupo receber sua identidade dos indivíduos contidos nele.



Reconhecimento do caráter coletivista da cultura do primeiro século de Paulo domina um firme consenso de apoio acadêmico.[23] De fato, em uma importante monografia recente que trata da salvação do indivíduo no pensamento de Paulo, Gary Burnett busca reparar o que ele percebe ser uma ênfase exagerada no recente estudo do Novo Testamento sobre o caráter coletivo do pensamento de Paulo que praticamente exclui uma apreciação de suas preocupações individuais.[24] Todavia, embora ele afirma vigorosamente em favor da preocupação de Paulo com a salvação do indivíduo, até Burnett reconhece que a cultura de Paulo era de orientação coletiva ao invés de individualista e que havia pouco individualismo no primeiro século.[25] Além disso, ele reconhece que no Antigo Testamento, a tradição judaica de Paulo e a própria perspectiva de Paulo, tanto a comunidade quanto o indivíduo eram importantes, mas que a comunidade era primária e o indivíduo importante dentro do contexto da comunidade.[26]Ele descreve apropriadamente a visão judaica biblicamente formada:



Kaminsky… sugere que é sempre o caso [na Bíblia hebraica] que o “próprio auto-entendimento do indivíduo era derivado de seu ou sua relação com a comunidade”. É o indivíduo como um membro da comunidade onde se encontra a ênfase, não o indivíduo como uma “entidade autônoma diante de Deus”.[27]... A [s]alvação era tanto uma questão para o indivíduo como para a comunidade do povo de Deus. Alguém teria parte na salvação que Deus preparou para o seu povo vivendo como parte do povo da aliança.... Somente deliberadamente pecando e recusando arrepender-se que alguém poderia tornar-se apóstata e colocar-se fora da aliança e portanto fora da salvação. A piedade pessoal, notamos, deve ser vista no contexto dos indivíduos buscando viver dentro da aliança, e em tal contexto, a salvação era tipicamente vista como dizendo respeito à nação (ou o grupo sectário dentro da nação), algo no qual um indivíduo participaria, assumindo que ele permanecia dentro das limites da aliança. Vemos, então, dentro do Judaísmo a importância da responsabilidade individual e ativa participação na relação da aliança com Deus; isto indica claramente para nós a interdependência do indivíduo e da comunidade. O indivíduo não era classificado dentro do grupo maior, mas nem era ele um agente autônomo. Havia um sentido muito mais equilibrado de ambos, indivíduo e comunidade.[28]



Dessa forma, a visão corporativa da eleição do Antigo Testamento e do Judaísmo, o emprego exclusivo de Paulo da linguagem corporativa em ligação com a eleição para salvação e a orientação corporativa do contexto sócio-histórico de Paulo, tudo combina para fornecer um argumento muito forte que a visão da eleição de Paulo era corporativa, e que ele carregou esta visão da eleição, que procede das Escrituras que ele interpreta, em Romanos 9. Não adianta argumentar que a entrada individual dos judeus e gentios na Igreja requer um conceito de eleição individual,[29] pois, como vimos, o conceito de eleição corporativa admite a separação individual da e entrada na comunidade eleita sem mudar o foco da eleição para o indivíduo. Além disso, como Howard Clark Kee bem disse, “Embora um ato de decisão poderia alinhar o indivíduo com uma ou outra de... [as] facções rivais dentro do Judaísmo neste período, o resultado da decisão era uma forma de identidade da comunidade”.[30] Como mencionado anteriormente, a visão bíblica da eleição corporativa, que reconhece o lugar do indivíduo, priva muito do argumento de Schreiner de sua força. Isto se tornará claro conforme analisarmos as quatro linhas de argumento que ele apresenta para apoiar sua tese.



IV. EXAMINANDO O CASO CONTRA A PRIMAZIA DA

ELEIÇÃO CORPORATIVA EM ROMANOS 9



1. A linguagem singular. Schreiner argumenta que o uso repetido da linguagem singular em Romanos 9 apoia o conceito tradicional da eleição individual e faz oposição à sugestão que Paulo faz referência somente a grupos corporativos.[31] Mas imediatamente encontramos uma falha principal que permeia cada um dos quatro pontos principais de Schreiner, a saber, que a eleição corporativa envolve somente o grupo sem nenhuma consideração com o indivíduo. Isto é, como temos visto, um entendimento defeituoso da eleição corporativa. Antes, falar da eleição como corporativa ao invés de individual significa que o foco primário da eleição é a comunidade e que o indivíduo é eleito somente secundariamente como membro da comunidade. Portanto, a referência de Paulo a indivíduos de forma alguma é inconsistente com o conceito da eleição corporativa. A questão importante está onde a ênfase primária se encontra e se os indivíduos são vistos como eleitos como membros de um grupo ou como indivíduos isolados que são, então, por assim dizer, reunidos em um grupo. Os dados que examinamos sugerem que a perspectiva corporativa predomina. Não há nenhuma razão por que a presença da linguagem individual exigiria uma redefinição do que foi nesse tempo a percepção padrão da orientação da eleição, visto que a visão padrão incluía indivíduos em sua extensão. Além disso, é necessário determinar se a linguagem individual que Paulo usa na verdade diz respeito diretamente à eleição.



Seja como for, alguma da linguagem singular que Paulo usa em Romanos 9 de fato apoia a primazia da eleição corporativa no capítulo tanto quanto as referências individuais à eleição de Isaque e Jacó discutidas anteriormente. Schreiner aponta para a citação de Paulo de Êx 33.19 em Rm 9.15: “Compadecer-me-ei de quem me compadecer, e terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia”. Ele argumenta que o singular òv (“quem”) indica que Paulo tem em vista indivíduos específicos que recebem a misericórdia de Deus. Mas em seu contexto original, a linguagem singular de Êx 33.19 na verdade se refere ao Israel corporativo e sua restauração à eleição da aliança.[32] Na tradução da Septuaginta, que Paulo cita, é um caso de referir-se a uma entidade corporativa com terminologia singular na medida em que ela representa o pensamento do hebraico original, um tipo de singular coletivo.[33] Em harmonia com a visão corporativa da eleição do Antigo Testamento, o contexto altamente de aliança, e as preocupações específicas de seu contexto narrativo, o òv de Êx 33.19 tem a ver com quem Deus reconhecerá como seu povo da aliança. Na verdade, Paulo usa òv a respeito do povo corporativo de Deus em Rm 11.2. No que diz respeito à eleição, os indivíduos entram em vista em virtude de sua associação com o grupo.



Quando Paulo usa o singular para fazer uma inferência de Êx 33.19 em Rm 9.16, ele não fala diretamente dos objetos individuais da eleição, mas simplesmente chama a atenção que a decisão acerca de quem Deus concede sua misericórdia depende dele (e as estipulações que ele escolhe estabelecer) ao invés da vontade ou esforço do homem, o próprio ponto feito por Rm 9.18, onde o singular aparece novamente (òv/quem), exceto que ele acrescenta o fato que Deus também tem o direito de julgar/endurecer aqueles que decidir também. Mas significativamente, a forma de 9.18 é seguramente baseada em Êx 33.19 e em seu pronome relativo singular coletivo ad sensum, sugerindo o que alguém poderia ter imaginado já do contexto de Romanos 9 apenas, que os singulares de Rm 9.18 dizem respeito a grupos ou classes de pessoas. Os exemplos finais de singulares notados por Schreiner aparecem em Rm 9.19, 21, onde Paulo muda para uma diatribe, apoiando o v. 18, especialmente sua defesa do direito soberano de Deus de endurecer quem ele quiser. Dado o propósito coletivo do contexto, estes singulares são melhor vistos dentro de uma perspectiva corporativa. Ainda assim, é importante observar que estes singulares não se referem à eleição diretamente. O singular τίς (“quem”) de 9.19 é usado para apresentar o ponto que ninguém resiste à vontade de Deus como parte de uma objeção ao argumento de Paulo que é subsequentemente tratada. O singular σκεύος (“vaso”) de 9.21 é parte de uma ilustração que Paulo usa em sua refutação da objeção em 9.19. É ignorar a questão assumir que o vaso singular deve referir-se a um indivíduo. Ele poderia igualmente referir-se a um grupo de pessoas como Israel ou a Igreja. De fato, quando Paulo especificamente aplica a ilustração, ele faz assim em linguagem corporativa (9.22ff.). Ademais, o histórico veterotestamentário mais importante por trás das imagens de Paulo aplica a metáfora a Israel como um povo ou a um grupo dentro de Israel, textos enraizados em uma visão corporativa da eleição que lida com o indivíduo dentro de sua extensão (Is 29.16; 45.9; 64.8; Jr 18).



2. A seleção de um remanescente. Schreiner argumenta que a seleção de um remanescente de Israel referido em Rm 9.6-9 e 11.1-6 necessariamente envolve a seleção de certos indivíduos de um grupo maior.[34] Mas o próprio conceito de um remanescente é de natureza corporativa. Schreiner reconhece este ponto, mas faz pouco mais do que insistir que isto não exclui os indivíduos, apontando para o uso de Paulo de si mesmo como exemplo de um indivíduo que é parte do remanescente. Entretanto, esta linha de argumento novamente se fundamenta na falsa suposição de que a eleição corporativa exclui os indivíduos de sua consideração. Mostrar que os indivíduos eram parte dos grupos aos quais eles pertenciam ou eram afetados pelo que seus grupos eram afetados em nada contribui para determinar onde o foco da eleição se encontra.



Por outro lado, pareceria que até a perspectiva de Paulo daqueles que compõem o remanescente era corporativo, focalizando sobre judeus e gentios (9.24-33).[35] Além disso, já vimos como um das passagens mencionadas por Schreiner (Rm 9.6-9) se ajusta diretamente na concepção corporativa da eleição (veja III.1 acima).[36]Rm 11.1-6 não é diferente. Ele claramente focaliza primariamente sobre o povo de Deus: “Digo, pois: Porventura rejeitou Deus o seu povo? De modo nenhum; porque também eu sou israelita, da descendência de Abraão, da tribo de Benjamim. Deus não rejeitou o seu povo, que antes conheceu” (Rm 11.1-2a; ênfase minha). Paulo usa a si próprio, um judeu étnico individual, como evidência de que Deus não rejeitou o Israel étnico completamente. Mas note que a linguagem da eleição é especificamente vinculada ao povo corporativo. Esse é onde o foco da eleição se encontra nesta passagem, como muitos comentaristas (incluindo os calvinistas) defendem.[37] O fato que Paulo é parte do remanescente corporativo, o verdadeiro Israel, mostra que Deus não descartou o povo judeu ou simplesmente deslocou a eleição para os gentios. A própria eleição de Paulo é melhor vista como derivando sua associação com o remanescente corporativo.



3. A validade de distinguir entre indivíduos e grupos em Rm 9.30-10.21. Schreiner afirma que Paulo inegavelmente faz referência a indivíduos assim como ao Israel corporativo em Rm 9.30-10.21 e que é impróprio distinguir entre indivíduos e os grupos dos quais eles são parte, porque o que é verdadeiro do coletivo é necessariamente verdadeiro de seus membros individuais.[38] Mas, mais uma vez, ele afirma contra a visão que Paulo fala “somente de grupos corporativos em Romanos 9-11 e não está fazendo referência a indivíduos.”[39] Por essa razão, ele parece crer que meramente precisa mostrar que os indivíduos são parte das questões que Paulo discute a fim de refutar a ideia da eleição corporativa. Entretanto, temos visto que este tipo de argumento não se aplica ao conceito da eleição corporativa que é inerente na tradição bíblica, que, não obstante, torna improvável o conceito calvinista tradicional da eleição individual.



É importante reconhecer que Paulo não está falando diretamente sobre a eleição em Rm 9.30-10.21. Contudo, é verdadeiro que sua discussão diz respeito em alguma medida à base da eleição corporativa (9.30-10.4) e os meios pelos quais os indivíduos tornam-se parte do grupo eleito (10.5-13) – fé. Todavia, demonstrar que Paulo fala sobre indivíduos exercendo fé de forma alguma contradiz a ideia da eleição corporativa. Como temos visto, o conceito sempre incluiu indivíduos dentro de sua extensão sem concentrar a eleição no indivíduo. De fato, eu argumentaria que Rm 9.1-9 no contexto de Romanos afirma que a fé sempre foi o meio para o indivíduo verdadeiramente possuir as bênçãos da eleição divina corporativa. Além disso, tal papel da fé deve ser esperado em uma doutrina da eleição articulada deste lado da cruz, que acha que a eleição corporativa de Israel veio ao seu cumprimento em Cristo, a verdadeira semente de Abraão e o representante da aliança do povo de Deus.



A própria tentativa de Schreiner de relacionar a linguagem corporativa de Paulo com as suas inevitáveis implicações para os indivíduos mostra que o aspecto corporativo das questões que Paulo aborda tem precedência sobre – mas não exclui – o aspecto individual. Ele observa que Paulo fala de Israel como uma entidade corporativa deixando de obter a justiça de Deus, mas que isto não se aplica a todo indivíduo israelita. Todavia isto parece contradizer seus próprios pontos que Paulo fala igualmente do grupo e do indivíduo e que o que quer que seja verdadeiro do grupo também deve ser verdadeiro do indivíduo da mesma forma. Ele parece estar dizendo que Paulo fala geralmente, mas que o que Paulo diz deve aplicar ao nível individual. Eu concordo. Mas dizer que Paulo fala geralmente (de tal forma que não se aplica a todo indivíduo) é reconhecer que Paulo não fala igualmente do grupo e dos indivíduos, mas que seu foco está no grupo, ainda que o que ele diz certamente se aplica aos indivíduos. Este é na verdade um aspecto diferente do pensamento e terminologia corporativos do que achamos no caso da eleição, no qual a associação de alguém no grupo determina a própria situação. Mas estes dois aspectos do pensamento corporativo procede da prioridade do grupo na perspectiva simultânea do escritor.[40]



Enquanto Rm 9.30-10.21 não põe em dúvida o conceito da eleição corporativa como Schreiner sustenta, o amplo contexto interno de Romanos 9-11 fornece apoio para a noção de diversas formas, algumas das quais já temos examinado. Aqui, mencionaremos apenas uma: a metáfora da oliveira de Paulo (Rm 11.17-24). Ela demonstra a ideia da eleição corporativa muito bem. A oliveira indubitavelmente representa o povo eleito de Deus (embora deve ser admitido que a eleição não é a preocupação principal de Paulo aqui). Mas os indivíduos são enxertados no povo eleito e participam da eleição e de suas bênçãos pela fé ou são cortados do povo escolhido de Deus e de suas bênçãos por causa da incredulidade.[41] O foco da eleição é claramente o povo corporativo de Deus com os indivíduos participando da eleição por meio de sua participação (através da fé) no grupo eleito, que transpõe a história da salvação.



4. A seleção de um grupo ao invés de outro e a própria validade do conceito de eleição corporativa. Em sua seção final, Schreiner argumenta que a eleição corporativa não é menos arbitrária do que a eleição individual calvinista e que a visão típica da eleição corporativa é ilusória, visto que ela não exige a eleição de pessoas de nenhuma forma, mas de uma entidade abstrata ou de um conceito.[42]



a. A arbitrariedade da eleição e Rm 9.11-12, 16. Acerca da arbitrariedade da eleição, Schreiner essencialmente argumenta que, mesmo se a eleição corporativa fosse verdadeira, Rm 9.11-12, 16 significaria, então, que Deus predestina a fé do grupo eleito e que a fé é dessa forma a consequência da eleição. Mas esta construção é suspeita. Rm 9.11-12 na verdade não busca fazer uma exposição da eleição per se, mas usa o exemplo da eleição de Jacó (com toda sua significância corporativa) para fazer uma afirmação sobre o propósito de Deus na eleição,[43] que ela permanece baseada na soberana vontade e chamado de Deus ao invés de obras humanas. O cumprimento do propósito e promessas de Deus para abençoar o mundo (cf. 9.4, 6-9) depende de sua soberana liberdade para designar quem ele escolhe como seu povo da aliança sob quaisquer condições que ele decide estabelecer.[44] Esta interpretação é confirmada pelo fato que 9.10-13 apoia a insistência de 9.8 que “não são os filhos da carne que são filhos de Deus; mas os filhos da promessa são contados como descendência.” A frase, “os filhos da promessa”, é uma rica designação que certamente inclui a fé como uma característica definidora daqueles a quem ela se refere, como Rm 4, 8; Gl 3-4 e o histórico do Antigo Testamento que cerca Isaque demonstram.[45]



Rm 9.16 então prova o mesmo que 9.11-12: a concessão da misericórdia de Deus está ao seu critério ao invés de estar ao critério do homem (veja também III.1 acima). O versículo não aborda as razões de Deus para dispensar misericórdia, ainda menos afirma que ele não tem razões que estão relacionadas às pessoas,[46] mas na verdade afirma que ele tem o direito de fazer como deseja. No contexto de Romanos em geral e Romanos 9-11, isto significa que ele tem o direito de considerar aqueles que têm fé como seu povo da aliança. A concessão da misericórdia de Deus “não depende do que quer, nem do que corre, mas de Deus que usa de misericórdia” (Rm 9.16).



Mas estas são questões de exegese que tem sido debatidas há tempos e exigem muito mais atenção do que eu posso dar aqui. Por agora, eu gostaria de registrar meu ceticismo acerca da alegação que Rm 9.11-12, 16 implica que a fé é um resultado predestinado da eleição. Mas mesmo se alguém concorda com a conclusão de Schreiner que estes versículos ao menos implicam que o povo de Deus são corporativamente eleitos incondicionalmente, sua visão defeituosa da eleição corporativa produz uma objeção fatal ao ponto maior que ele está tentando fazer destes versículos, a saber, que mesmo se a eleição corporativa for admitida em Romanos 9, a (alegada) eleição incondicional do grupo deve também significar a eleição incondicional direta dos indivíduos (como indivíduos). Pois a própria visão da eleição corporativa sustenta que o que é verdadeiro do povo eleito como um todo não é necessariamente verdadeiro dos indivíduos no grupo independentemente. Além disso, o que é verdadeiro do povo eleito como um todo não se aplica igualmente e diretamente aos indivíduos isoladamente, mas quando aplicável de alguma forma, ele se aplica secundariamente (todavia verdadeiramente) aos indivíduos como membros do grupo. Isto nos leva diretamente ao desafio de Schreiner à validade do conceito de eleição corporativa.



b. A validade do conceito da eleição corporativa. Schreiner acusa que os defensores da eleição corporativa “na verdade não creem na eleição corporativa de um grupo ou de pessoas” mas na escolha de Deus de uma entidade ou um conceito abstrato.[47] Mas isto simplesmente não é verdadeiro. Como vimos, os indivíduos participam do status de eleitos do grupo dos eleitos. Eles são verdadeiramente eleitos, mas somente secundariamente, como membros do grupo. Aqui está o escândalo da eleição corporativa às sensibilidades individualistas modernas, que acham difícil de compreender formas corporativas de pensamento: o grupo é primário e o indivíduo secundário. Parece que, porque o indivíduo não é primário na visão corporativa, Schreiner não consegue ver que as pessoas estão envolvidas de alguma maneira, e, portanto, o conceito não faz sentido para ele. Isto sugere uma incapacidade de entender a perspectiva corporativa, que foi tão proeminente entre os antigos, devido às compreensões individualísticas.



De fato, o argumento de Schreiner na prática nega o conceito veterotestamentário vastamente reconhecido da eleição. Será que ele discutiria que a eleição de Israel em Abraão/Isaque/Jacó foi a eleição de um conceito antes que de um povo? Talvez ele afirmaria que, a luz de seus argumentos, o conceito da eleição veterotestamentário deve ser igualmente individual e que o Antigo Testamento contém um conceito desenvolvido de eleição individual. Mas isto seria difícil de defender. Há pouca evidência para ele no Antigo Testamento conforme o comentário de Piper citado acima (veja III.1 acima) e o grande peso da opinião acadêmica seria sugestivo. Claramente, o conceito veterotestamentário da eleição corporativa é tanto coerente quanto é eleição de pessoas ainda que os indivíduos não são o foco. Se isto está correto, então o argumento de Schreiner sobre a invalidade da eleição corporativa desmorona.



É a primazia do grupo sobre o indivíduo que ajuda a explicar por que a insistência de Schreiner que, se um grupo é escolhido, então os indivíduos devem também ser escolhidos diretamente como indivíduos, está equivocada. Já vimos tanto que Schreiner admite que a linguagem corporativa não necessariamente se aplica a todo indivíduo em um grupo como que isto demonstra que o foco de tal linguagem está no coletivo (veja III.3 acima). Podemos agora acrescentar que é muitas vezes verdadeiro que, em uma perspectiva corporativa, a identidade do grupo transcende a identidade do indivíduo ou a mera coleção de entidades individuais. Como o antigo ditado diz, “o todo é mais do que a soma das partes.” Todavia, isto não significa que no caso de um grupo de pessoas, o todo é somente uma entidade ou um conceito abstrato, embora seja verdadeiro que um grupo é inerentemente mais geral e abstrato do que indivíduos específicos. Antes, significa que a identidade e a realidade corporativa transcende a do indivíduo por si mesmo e que algumas coisas que são verdadeiras do grupo não poderiam ser verdadeiras do indivíduo. Também significa que a experiência do indivíduo das realidades corporativas depende de sua participação no grupo.



A analogia de um time de baseball oferecida por Schreiner fornece na verdade uma boa ilustração de tais modos corporativos de pensamento e testemunha contra seu próprio argumento. Sem dúvida, a analogia mostra que “escolher um time requer que você escolha um time entre outros junto com os indivíduos que o compõem.”[48] Mas Schreiner deixa de observar que a compra de um time de baseball é mais corporativamente do que individualmente orientado. Alguém compra/“elege” o time, e os jogadores individuais que fazem parte do time são escolhidos como consequência de sua associação com o time.



Alguém familiar com a atividade do baseball profissional sabe que quando um novo proprietário compra um time, ele não seleciona individualmente cada jogador que ele quer que esteja no time, mas adquire os jogadores individualmente no time como consequência de sua compra corporativa.[49] Antes, a real associação individual com o time é variável e pode ser diferente de um dia para o outro, antes ou depois de uma venda. Mas visto que o proprietário possui o time, ele “possui” quem quer que pertença ao time. Há uma distinção entre a compra do time/o status do time como possuído ou eleito por um lado e a adição de jogadores individualmente ao time de outro. O time permanece primário, e a adiçao ou exclusão de jogadores individualmente é orientada ao time, em cuja participação une o jogador individualmente aos benefícios, responsabilidades e destino do time. Assim, embora formalmente correta, a asserção de Schreiner de que a eleição corporativa exige a eleição individual não está correta conforme ele pretende.



A identidade de um time profissional de baseball transcende a mera reunião de seus membros individualmente assim como a identidade de quaisquer de seus membros individuais. É uma entidade corporativa que em muitos casos atravessa gerações, interligando todos que participam dela por sua identificação com sua identidade corporativa. Ampliando a analogia, poderíamos imaginar que cada ano a Liga Americana aleatoriamente selecionasse pela sorte um de seus times para um prêmio especial que concederia ao time notoriedade especial como seu “time do ano” e um bônus especial de 20.000 dólares para cada membro do time. Isto é equivalente a uma eleição incondicional. Mas nenhum jogador poderia alegar que ele foi individualmente escolhido como “o jogador do ano” ou até mesmo receber o bônus. A eleição incondicional do time não significaria a eleição incondicional dos jogadores individuais como indivíduos. Enquanto o time de fato seria eleito incondicionalmente, os jogadores individuais somente seriam eleitos como consequência de sua associação com o time. Ao mesmo tempo, alguém poderia dizer que os jogadores individuais foram incondicionalmente eleitos como membros do time. Além disso, jogadores que se unissem ao time no meio da temporada viriam a compartilhar da eleição incondicional do time.



Minha intenção não foi tornar o baseball profissional determinante para a nossa concepção da eleição, mas pegar a própria analogia de Schreiner e demonstrar que ela realmente não apoia seu mais amplo argumento para a eleição individual calvinista, mas na verdade apoia o conceito da eleição corporativa que temos articulado. Não é que Schreiner deixa de demonstrar que a eleição corporativa deve de alguma forma envolver os membros individuais do grupo. Isto de forma alguma é a questão entre a eleição corporativa e a individual. Sobre isto as duas visões concordam. Mas a eleição individual calvinista afirma muito mais. Ela afirma que os indivíduos são (incondicionalmente) eleitos para fazer parte do povo eleito. O conceito de eleição corporativa não sustenta isto, nem a analogia de Schreiner. Parece que a eleição corporativa evita a arbitrariedade da visão calvinista afinal de contas.



c. Eleição em Cristo e Ef 1.4. Mas como é que os indivíduos compartilham da eleição do povo de Deus? Schreiner corretamente observa que os defensores da eleição corporativa enfatizam que a eleição é em Cristo (Ef 1.4).[50] Mas ele incorretamente afirma que esta ideia significa que Deus elegeu a Igreja “para estar em Cristo.”[51] Isto é exatamente o que sua citação de Forster e Marston como defensores da visão nega.[52] A ideia é, antes, que Jesus é o Eleito (Schreiner acerta este ponto) e a Igreja foi escolhida como consequência de sua participação em Cristo. Cristo é a esfera da eleição. Todos que estão nele compartilham de sua eleição como todos que estavam em Jacó/Israel eram também eleitos.



Mas Schreiner discorda desta interpretação de Ef 1.4. Ele objeta que o texto não fala da eleição de Cristo, mas da eleição do povo. Mas a eleição de Cristo é certamente parte do segundo plano e significado do versículo. Schreiner está correto em dizer que o versículo enfatiza a eleição do povo antes que a eleição de Cristo (embora mesmo este ponto possa ser colocado em dúvida pela notável ênfase na frase “em Cristo” ou seu equivalente por toda parte de Ef 1.3-14). Mas a interpretação corporativa de Ef 1.4 não muda a ênfase do versículo para a eleição de Cristo, mas simplesmente revela o segundo plano da linguagem e nos ajuda a entender o que significa para Deus ter escolhido a Igreja em Cristo. O versículo claramente assume a eleição de Cristo da mesma forma que afirmações veterotestamentárias similares da eleição/bênção “em Abraão,” “em Isaque,” e “em Jacó/Israel” assumem a eleição/bênção dos representantes da aliança do povo de Deus. Para tomar um exemplo de Rm 9.7/Gn 21.12, não pode ser negado que a eleição de Isaque forma parte do segundo plano e significado da afirmação a Abraão que “em Isaque será chamada a tua descendência.” O ponto é que a Igreja foi escolhida como consequência de sua união pactual com Cristo, que representa a Igreja e totaliza seu povo em si mesmo.



Isto na verdade ajuda a esclarecer como é que a Igreja foi escolhida antes da fundação do mundo. A eleição de Cristo, o cabeça corporativo pré-existente da Igreja, antes da fundação do mundo envolve a eleição da Igreja porque ele é o cabeça e representante corporativo da Igreja, e o que é verdadeiro dele como seu representante é também verdadeiro deles, seu corpo. Isto é semelhante ao fato que Israel foi escolhido em Abraão/Isaque/Jacó antes da nação sequer existisse (cf. o modo que Levi pagou o dízimo em Abraão conforme Hb 7.9-10). Não é que o povo de Israel estava de alguma forma literalmente existente em Abraão, mas a escolha do representante corporativo necessariamente inclui a escolha da entidade corporativa que ele representa.



Agora, quando indagamos quanto a como alguém vem a estar em Cristo, a resposta de Paulo é, obviamente, através da fé (veja, por exemplo, Rm 3-4, 8; Gl 3-4). Dessa forma, a objeção de Schreiner à fé como a base da eleição é infundada. É verdadeiro que Ef 1.4 não menciona a fé, mas nem ela especificamente afirma que a eleição é incondicional. O que ela diz é que a eleição é em Cristo, o que sabemos na teologia paulina ser em parte uma maneira de indicar uma esfera de identidade pela qual se entra através da fé. Mas a ideia não é que a escolha de Deus foi baseada em nossa fé prevista per se. É que a eleição da Igreja é íntrinseca à eleição de Cristo, e a associação com a Igreja é baseada na fé, uma ideia sugerida pela implicação de Ef 1.13 que os cristãos são selados em Cristo com o Espírito Santo como resultado de ouvir e crer no evangelho.



A própria interpretação da declaração de Ef 1.4 de Schreiner da eleição em Cristo é que ela indica que Cristo é o agente através de quem a eleição é cumprida. Mas esta interpretação na verdade não impede o sentido incorporativo da frase exposta acima. Ambos os sentidos estão provavelmente presentes. De fato, o sentido incorporativo necessariamente inclui o instrumental, embora o oposto não seja necessariamente verdadeiro. O sentido incorporativo é fortemente sustentado pela significação obviamente incorporativa da mesma linguagem em outras partes em Efésios, tais como a identificação de Cristo como o cabeça da Igreja/seu corpo (1.20-23), a ressurreição/nova criação da Igreja em Cristo (2.6-10; cf. a semelhança de 2.6 e 1.3 com sua linguagem dos “celestiais”!), e a incorporação dos judeus e gentios em Cristo como um novo homem/corpo/templo (2.11-22) para citar apenas alguns exemplos. A tentativa de Schreiner de restringir a linguagem “em Cristo” de Paulo em Ef 1.4 a um sentido instrumental simplesmente não faz justiça à evidência de Efésios.[53] Apesar de sua afirmação, uma eleição corporativa na qual indivíduos participam através da fé dificilmente pode ser considerada insignificante. Àqueles que estão em Cristo, ela significaria tudo, como Ef 1.3-14 testifica.



d. O papel da lógica. De tudo o que foi dito, não deve ser preciso dizer que o apelo de Schreiner à lógica como exigindo a eleição individual calvinista não tem fundamento.[54] Sua afirmação de que a eleição corporativa deve envolver indivíduos é um truísmo simplista que ignora a sutileza da relação entre o coletivo e o individual e da questão do foco da eleição. O resultado é que seu ataque ao conceito de eleição corporativa através de tentativas repetidas de mostrar que os indivíduos devem estar em vista quando se fala de grupos porque grupos são compostos de indivíduos equivale a abater um espantalho se uma visão adequada da eleição corporativa estiver sob consideração.[55]



Mas Schreiner está totalmente correto em insistir que a lei da não-contradição não pode ser abandonada. Pois sem ela, toda comunicação se torna sem sentido. É por isso que não pode haver nenhuma liberdade humana genuína se a doutrina calvinista da determinação divina absoluta de todas as coisas é verdadeira. É por isso também que a interpretação calvinista que leva Romanos 9 a ensinar que Deus absolutamente determina quem exercerá fé e Romanos 10 a ensinar “que aqueles que não exercem fé são responsáveis e deviam ter crido”[56] força uma posição ilógica sobre Paulo. Schreiner gostaria de relegar a relação entre a soberania divina e a responsabilidade humana ao status de mistério. Mas eu argumentaria que o conceito teológico/filosófico (como em oposição ao bíblico) do mistério que Schreiner invoca deve ser reservado para realidades nas quais nós não sabemos como algo funciona, mas nas quais não há contradição lógica.



O exemplo da Trindade que ele conta é bom. Não é contraditório porque ele afirma que há três pessoas em um Deus antes que Deus é três pessoas e todavia uma pessoa. Mas é misterioso porque não sabemos como três pessoas podem existir em um ser. Entretanto, afirmar que Deus absolutamente predetermina as ações humanas e que os seres humanos são livres é um absurdo.[57] Da mesma forma é a ideia que alguém cuja falta de fé foi absolutamente predeterminada devia ter crido. Mas estas questões foram debatidas por milênios e é improvável que eu consiga persuadir alguém comprometido com o compatibilismo nesses breves comentários sobre o papel da lógica na discussão.



Enfim, a exegese bíblica e não o comprometimento filosófico é que deve determinar nossas conclusões teológicas sobre a eleição. Isto é um ótimo sinal para a tese de que Romanos 9 manifesta um conceito corporativo da eleição antes que um conceito individual calvinista. Pois a ênfase de Paulo aí é claramente corporativa e se encaixa confortavelmente no conceito veterotestamentário da eleição corporativa no qual os textos que ele invoca estão saturados. Romanos 9 não ensina a eleição individual no sentido tradicional, nem que Deus determina quem irá crer. Isto se harmoniza lindamente com Rm 9.30-10.21, que Schreiner admite, “nos ensina que aqueles que não exercem fé são responsáveis e deviam ter crido.”[58] Quando emparelhado com seu próprio postulado da eleição individual incondicional em Romanos 9, Schreiner é compelido a perguntar, “Como ambas podem ser logicamente verdadeiras?”[59] e ele é forçado a recorrer ao conceito de mistério. Apesar de não ser fatal à sua visão, isto não prontamente a aprova. A lógica, que ele tenta afirmar como apoiando a sua posição contra a eleição corporativa, certamente favorece uma interpretação que não exige tal inconsistência no argumento de Paulo.



V. CONCLUSÃO



A defesa de Thomas Schreiner de uma leitura calvinista de Romanos 9 baseada na suposição de que a eleição corporativa e individual são inseparáveis não é convincente. Praticamente, seu argumento abate um versão espantalho da eleição corporativa.[60] Um dos pontos principais de todo o seu argumento em apoio da tese que a eleição deve ser tanto corporativa quanto individual é mostrar que o que é falado do grupo deve envolver indivíduos de alguma forma. Mas a visão bíblica da eleição corporativa sempre conteve indivíduos dentro de sua extensão baseado em sua participação no grupo/identificação com o representante corporativo sem estender o conceito de eleição à entrada no povo eleito ou mudar o foco da eleição para o indivíduo. Os indivíduos foram eleitos, mas somente como membros do povo eleito. Portanto, uma parte crucial do principal fundamento da tese de Schreiner na verdade não faz oposição a uma visão adequada da eleição corporativa, que reconhece que realidades corporativas devem aplicar-se aos indivíduos e não fornece nenhum apoio à concepção calvinista.



Uma visão precisa da eleição corporativa destroi muito da argumentação de Schreiner. Sua inclusão de indivíduos dentro de sua extensão explica a referência aos indivíduos na linguagem e pensamento de Romanos 9-11 e contradiz a alegação de Schreiner de que ela implica somente a eleição de um conceito abstrato antes que um grupo de pessoas. Por outro lado, um cuidadoso exame de Romanos 9-11 revela que sua linguagem e pensamento individual são na verdade coporativamente orientado, quer alguém pensa na linguagem singular do capítulo 9, na seleção de um remanescente nos capítulos 9 e 11, ou na fé ou fracasso dos indivíduos no capítulo 10.



O que Schreiner deixa de abordar adequadamente é a relação entre o grupo e o indivíduo. Sua afirmação de que a eleição corporativa deve envolver indivíduos revela-se um truísmo simplista que negligencia as complexidades do pensamento corporativo. Ele parece supor de forma simples demais que há uma correlação um a um entre o grupo e o indivíduo, de forma que o que é verdadeiro do grupo é verdadeiro do indivíduo exatamente da mesma maneira. Portanto, para Schreiner, se o grupo foi selecionado, então isto implica que cada membro individual do grupo foi selecionado independentemente para tornar membro do grupo. Mas isto não necessariamente segue, e como vimos, não se encaixa nos contornos do pensamento corporativo, que considera o grupo como primário e o indivíduo como secundário. Tal perspectiva descobre (1) a identidade e a realidade corporativa transcender a do indivíduo em si mesmo; (2) que algumas coisas que são verdadeiras do grupo podem não ser verdadeiras do indivíduo; e (3) que a experiência do indivíduo das realidades corporativas depende de sua participação no grupo.



A pergunta importante sobre a eleição que deve ser respondida diz respeito à sua orientação primária. Ela é corporativa ou individual? Schreiner, conscientemente ou não, pressupõe que é individual. De fato, ele não parece capaz de entender a perspectiva corporativa devido às modernas concepções individualistas. Isto é provavelmente por que ele afirma que ela exige maiores explicações.[61]Espero que este presente artigo satisfaça esta exigência.



A crítica de Schreiner da eleição corporativa não tem êxito na confirmação da visão calvinista da eleição individual em Romanos 9. A visão da eleição do Antigo Testamento e do Judaísmo era corporativo, o próprio Paulo somente falava explicitamente da eleição para salvação em termos corporativos, e o contexto sócio-histórico de Paulo era solidamente coletivista. Além disso, Paulo, que lida com a Escritura extensivamente em Romanos 9-11 e tenta mostrar que suas concepções estão de acordo com ela, faz referência a um número de passagens que evidenciam uma visão corporativa da eleição. Ademais, o conceito veterotestamentário da eleição corporativa inclui a separação e entrada individual na comunidade eleita sem mudar o foco da eleição para o indivíduo. O ônus da prova deve estar com aqueles que afirmam que Paulo se afastou desta concepção bíblica e judaica padrão da eleição. Se for afirmado que a mudança do foco da eleição de Abraão ou Jacó/Israel a Cristo exige tal afastamento, eu chamaria a atenção que a eleição em Cristo é apenas o cumprimento da eleição de Israel e que esta eleição se encaixa perfeitamente no padrão do Antigo Testamento. Novamente, se for objetado que isto estabelece um padrão impossível porque Paulo em parte alguma argumenta diretamente em favor da eleição individual de tal maneira que não encaixa em uma perspectiva corporativa, eu responderia que isso é exatamente o ponto. Teríamos que assumir a visão corporativa a menos que houvesse alguma boa razão em contrário. Nem Paulo nem o restante do Novo Testamento nos dá qualquer razão para fazer este salto.[62] Muito pelo contrário, eles, não menos que Romanos 9, apoiam a visão corporativa através da linguagem corporativa, contexto sócio-histórico e recurso ao Antigo Testamento. Em resposta à pergunta de Schreiner, “Romanos 9 ensina a eleição individual para salvação,” devemos responder, não, ela não ensina. Ela contém uma visão corporativa da eleição para salvação que concede status de eleito a todos aqueles que estão em Cristo.






Tradução: Paulo Cesar Antunes