Introdução: Recuperando A História do Cristianismo Carismático
Texto: Eddie L. Hyatt
Tradução: Márcia Elias e Miqueias Oliveira
O Cristianismo Carismático não é apenas um fenômeno do século vinte. Já existe
desde que Jesus caminhou pela terra dois mil anos atrás. No século vinte,
entretanto, e continuando no século vinte e um, tem ocorrido uma explosão
verdadeira do Cristianismo Carismático. Começando com o movimento Pentecostal
em 1901, e revitalizado pelo movimento Carismático que começou por volta dos
anos 1960 e a Terceira Onda em 1980, essa explosão do Cristianismo carismático
ganhou um ímpeto e permeou cada faceta da vida da igreja. Desde o século
primeiro não havia tal ênfase generalizada do Espírito Santo e Seus dons. Seria
essa expressão de espiritualidade simplesmente heresia e fanatismo, como alguns
acusaram? Seria uma mera expressão marginal do verdadeiro Cristianismo, como
outros sugerem? Ou é de fato uma restauração do verdadeiro Cristianismo
bíblico? Indagações legítimas também foram feitas a respeito da historicidade
dessa forma dinâmica de Cristianismo. Ele voltou a aparecer de repente nesse
século sem nenhuma ligação histórica com a igreja do primeiro século, como
alguns argumentam? Ou será que de fato ele tem um precedente histórico? E por
que é chamado carismático? A palavra carismático deriva da palavra grega
charisma, a palavra do Novo Testamento para dom espiritual. Charisma, ou sua
forma plural, charismata, é a palavra que Paulo usa em 1 Coríntios 12:1-11
quando ele fala a respeito dos dons do Espírito Santo, tais como falar em
línguas, dons de cura, milagres e profecias. Por essa razão, qualquer grupo,
igreja ou movimento que abraça essa dimensão dinâmica do Espírito Santo e Seus
dons pode ser chamado carismático. Embora possam ser conhecidos historicamente
com Quakers, Metodistas ou Pentecostais, a propensão deles para o dinamismo do
Espírito Santo e Seus dons os qualifica para ser designados carismáticos. Pela
mesma razão, a igreja do primeiro século também pode ser denominada uma igreja
carismática.
QUAL É A DIFERENÇA?
A pergunta tem sido
frequente: qual a diferença entre os modernos Pentecostais e Carismáticos?
Talvez a distinção principal seja
relacionada com as diferenças das origens históricas dos dois movimentos. O
movimento Pentecostal teve início em 1901 na Bible School em Topeka, Kansas,
onde ocorreu um derramamento do Espírito Santo e a clássica doutrina
Pentecostal de falar em línguas como evidência do batismo com o Espírito foi
estabelecida e aplicada. O início do movimento Carismático moderno, por outro
lado, é usualmente identificado com o anúncio de Dennis Bennett em 1960, reitor
da St. Mark’s Episcopal Church in Van Nuys, Califórnia, de que tinha sido
batizado no Espírito Santo e falou em línguas. Outra importante distinção é o
fato de que o movimento Pentecostal foi rejeitado pelas igrejas da época e,
desde aquele tempo, mais de 740 novas denominações Pentecostais tem sido
formadas com mais de 65 milhoes de membros.
Em oposto, o movimento Carismático
alcançou um considerável grau de aceitação nas igrejas tradicionais onde era
frequentemente chamado de renovação. Mas mesmo com essa aceitação, que sempre
era morna, milhares de novas denominações Carismáticas se formaram desde 1960.
A terceira onda, ou movimento
neo-Carismático, também produziu milhares de novas denominações, mostrando a
dinâmica crescente e poder de cada sucessiva onda.
Apesar das diferenças de cada “onda”, o
estatístico David Barrett observa que uma “subjacente unidade” permeia todo o
movimento do século vinte. Por essa razão, ele cunhou a frase
Pentecostal/Carismático para se referir ao trabalho do Espírito Santo em toda a
terra. Ele vê os movimentos Pentecostal, Carismático e da Terceira Onda como um
único coeso movimento para o qual uma vasta proliferação de todos os tipos de
indivíduos e comunidades tem sido atraídas.
FENÔMENO DE CRESCIMENTO
Surpreendentemente,
cem anos atrás nem uma só congregação Pentecostal/Carismática, como entendemos
o termo hoje, existia. Agora menos de um século mais tarde, igrejas e
denominações Pentecostais e Carismáticas pontilham a paisagem religiosa e constituem
o mais dinâmico e crescente segmento da Cristandade.
Este espantoso crescimento foi
destacado pela pesquisa Gallup em 1980 publicada pela Christianity Today. A
pesquisa revelou que 19 por cento da população dos Estados Unidos, ou cerca de
50 milhões de pessoas, consideravam-se Pentecostais ou Cristãos Carismáticos.
Em uma pesquisa mais recente, de 1998 da Newsweek, 47 por cento dos Cristãos
pesquisados disseram que eles tinham “experiência pessoal com o Espírito
Santo”. Entre os Protestantes evangélicos, o quadro aumenta para 75 por cento.
Este fenômeno de crescimento é uma das principais razões pela qual o conhecido
teólogo de Harvard, Harvey Cox, se dispõe a dizer que o Pentecostalismo é “a
religião remodelada do século vinte e um.”
O DESAFIO DA
LEGITIMIDADE HISTÓRICA
Uma crítica com frequência dirigida ao
Pentecostais e Carismáticos modernos é que eles não possuem nem tradição e nem
história. O argumento se parece mais ou menos assim: a Igreja existe a mais de
dois mil anos, mas Pentecostais e Carismáticos a menos de cem anos. Esta
alegada ausência de história parece indicar que o movimento é, no mínimo,
periférico ao Cristianismo ortodoxo.
Este desafio da legitimidade histórica
é respondido de duas maneiras pelos proponentes do movimento. Pentecostais
Clássicos geralmente usam a abordagem restauracionista, encarando a si mesmos
como representando uma restauração da pura e poderosa igreja apostólica do
primeiro século. Por essa perspectiva, os mil e oitocentos anos intermediários
são considerados corrupção e queda espiritual.
Mais recentemente, alguns Pentecostais
e Carismáticos tem sido relutantes em omitir os mil e oitocentos anos de
história da igreja e tomaram uma abordagem mais tradicional. Eles procuram
preencher o considerado vácuo histórico constituindo funções eclesiásticas
tradicionais na estrutura de suas igrejas e instituindo liturgias tradicionais
nos seus cultos. Tais medidas são incentivadas, em parte, pela tentativa de
manter a continuidade com o passado identificando-se com as igrejas
tradicionais.
Nem a abordagem restauracionista e nem
a abordagem tradicional, entretanto, respondem adequadamente a questão
histórica. O fato é que Pentecostais e Carismáticos tem uma história legítima.
É uma história encontrada nos vários movimentos de avivamento e renovação que
emergiram de contínuo na vida da igreja. Porque foram frequentemente condenado
ou marginalizado pela igreja institucional, sua história tem sido submersa ou
sido mal interpretada. É, por essa razão, uma história carente de ser
descoberta e plenamente recuperada.
A ESTRADA PARA A
RECUPERAÇÃO HISTÓRICA
Este volume reúne um
número de elementos recuperados de estudos, pesquisa histórica. Escritos de movimentos
e pessoas corajosas desde o Dia do Pentecostes até o século vinte um.
Este estudo de maneira alguma é
exaustivo; muito embora muitos sejam os seus benefícios. Se permitido, pode
informar a pessoa sincera que busca a respeito da atividade dinâmica do
Espírito Santo através da história da igreja. Além disso, pode instruir aqueles
que aprenderiam com o passado. Pode também inspirar mais pesquisas e promover
mais conscientização e compreensão da rica história que devidamente pertence a
todo crente Pentecostal/Carismático.
Finalmente, a informação nesse livro
confirma que os Pentecostais/Carismáticos modernos possuem uma legítima e
excitante história. O seu elo com o passado não é um elo organizacional; é na
verdade, uma fé bíblica que continua a demonstrar o poder espiritual da igreja
apostólica do primeiro século. Na verdade, que o avivamento Pentecostal/Carismático
desse século é Cristianismo ortodoxo, isso é confirmado não somente pelo
próprio Novo Testamento, mas também pela existência de dois mil anos de
Cristianismo carismático.
Parte 1: A Igreja primitiva - A.D .100
A igreja do primeiro século foi uma igreja bem carismática. Lucas, o qual gravou sua história no Livro de Atos, ele fielmente incluiu a abundância do sobre natural que caracterizou a vida e ministério dele. O Falar em linguas, profecia, curas e milagres -- e todos os outros dons -- eram comuns, até mesmo antecipado como a norma (Atos 1:8;10:19; 13:2). Foi essas atividades dinâmicas do Espírito Santo na vida pessoal e individual dos crentes e na vida congregacional da igreja, em vez de estrutura organizacional , que proveu a base para a vida da igreja, comunidade e missão. De acordo com Gordon D. Fee, Paulo viu o Espírito “como a chave para toda as coisas na vida Cristã.” 1 T Enquanto os crentes levavam o evangelho de Jerusalém para fora ao mundo Greco-romano, esse caráter carismático continuou como a norma para as igrejas que surgiram através de seus ministérios. Isso é obvio pelo livro de Atos e também pelas epístolas de Paulo, onde ele falou abertamente sobre os milagres e dons espirituais. Ele declarou que ele “pregou inteiramente” o evangelho de Cristo aos gentios “em sinais e poder, pelo poder do Espírito de Deus” (Rm. 15:19, NVKJ). Em particular as cartas aos Coríntios, indicam que as igrejas dependiam da espontaneidade do Espírito Santo e não da autoridade oficial para a vida e direção das reuniões. Esses fatos levou a Hans Von Campenhausen a descrever a visão da igreja primitiva como “ De comunhão livre, desenvolvendo através da interação dos dons do Espírito e ministérios espirituais, sem o benefício de autoridade oficial ou anciões responsáveis.”2 O teólogo Católico Hans Kung, sugere que a igreja em Corínto “não conhecia nem episkopoi (bispos) nem presbuteros (elders) nem outro tipo de ordenação mas somente aqueles espontâneos indicados pelo Espírito Santo. “3 Ele então aponta que , de acordo com Paulo, eles foram providos com tudo que foi necessário. 4 Rudolph Bultmann concorda e insiste que a igreja do novo testamento, “As pessoas com mais autoridade são aqueles dotados dos dons espirituais. “5 James D.G. Dunn, no livro dele Jesus e o Espírito, demonstram que as mais primitivas igrejas procuravam pela imediata presença do Espírito Santo para suas comunidades e vida, ao invés de estrutura organizacional e formalidade. Ele também aponta que, além de Filipenses 1:1, “Paulo nunca se dirige a um grupo de liderança dentro da comunidade. “6 Para Dunn a implicação é clara: “ Se uma liderança é necessária, Paulo assumiu que o Espírito iria fornecer.”
Cargos ou Função?
As epístolas pastorais, que são de um periodo mais tarde da vida de Paulo, parece revelar uma estrutura mais formal para a vida da igreja. O termo presbuteros (elder) é usado pela primeira vez por Paulo, é qualificações são dadas para aqueles que iriam sevir como episkopoi (bispos) ou diakonoi (diacónos). Adolph Harnack sugere, portanto, que presbuteros, ou ancião, possa simplesmente denotar o velho em oposto do jovem. John Knox insiste, “Nós não estamos lidando com postos formais, mas com funções do qual pessoas certamente estão espiritualmente dotados como o de profecia e cura.” 8 Kung concorda e fala que a nomeação de anciões “não deve ser visto como o começo de uma hierarquia clerical.” Ele aponta que o surgimento de anciões/bispos devem ser entendido no contexto “de fundamentalmente uma estrutura carismática da igreja. “9
OBRAS MAIORES OU MENORES?
A igreja primitiva enfatizava que os dons não deviam ser uma surpresa sendo que Jesus ensinou seus discípulos a aguardar o poder e o dinamismo do Espírito na vida deles e em seus ministérios. Em uma ocasião, Ele os aconselhou que quando o Espírito viesse, eles iriam ser possibilitados a fazerem as mesmas obras que ele estava fazendo e até obra maiores (João 14:12). A igreja primitiva tinha uma expectativa que o ministério sobre natural estava então, enraizado na vida e ensinamentos de Jesus. Dunn fala, “Como ele foi carismático, assim também foram muitos, se não de todos os crentes primitivos. “10 Mas o que aconteceu depois do primeiro século-- depois da morte dos primeiros apóstolos? Será que os dons Pentecostais/Carismáticos de repente cessaram? Foram os dons de revelação deslocados pela formação do Novo Testamento? Por acaso sumiu o caráter sobre natural da igreja depois do fim da era apostólica da igreja? Em retrospecto, pode ser visto que havia um desaparecimento gradual do caráter carismático da igreja e um correspondente crescimento na estrutura organizacional. Todavia, dons espirituais continuaram a serem vitais como parte da vida da igreja no primeiro século. Escritos pós-apostólicos revelam nenhuma sabedoria ou expectativa da cessação em algum ponto no tempo. Aqueles que sucederam os apóstolos como líderes na igreja deixou, portanto, deixaram um testemunho claro da continuação dos dons e poder do Espírito em seus tempos.
Fonte: Eddie L. Hyatt, 2000 Years of
Charismatic
Christianity, page: 15 - 23